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Juliana Marchiote

A família e a Teoria do Jogos

A matemática humana.





Em 1928 o matemático John Von Neumann desenvolveu o Teorema Minimax. De acordo com esse teorema, é possível encontrar uma solução ainda que os interesses entre os envolvidos sejam completamente opostos.


Neumann e Morgenstern publicaram o livro "The Theory of Games and Economics Behavior" (Teoria dos Jogos e Comportamento Econômico), segundo os matemáticos, o comportamento da economia depende principalmente da interação entre os indivíduos, uma vez que ele afeta diretamente a formação de estratégias e as tomadas de decisões.


John Forbes Nash Junior, interpretado pelo Russell Crowe no filme Uma Mente Brilhante e ganhador do Prêmio Nobel em Economia, foi outro matemático que trabalhou no campo da teoria dos jogos, desenvolveu a teoria que ficou conhecida como Equilíbrio de Nash, significa, em rasas linhas, que nenhum dos jogadores pode aumentar seu ganho alterando sua estratégia de forma unilateral.


Para exemplificar: animais que convivem no mesmo ambiente, comem somente o necessário para a sua sobrevivência, caso coma o excedente, no futuro não terá comida e assim todos do grupo morrerão de fome.


Nesse sentindo, pode-se conceituar o princípio de equilíbrio, consoante dispõe Azevedo, como uma combinação de estratégias que os jogadores devem escolher, de maneira que nenhum jogador faria melhor se escolhesse outra alternativa, dada a estratégia que o outro escolhe. Ou seja, "a estratégia de cada jogador deve ser a melhor resposta às estratégias dos outros".


De maneira similar, Marinho dispõe:

A Teoria dos Jogos é um modelo racional de modelagem dos processos de tomada de decisão, aplicável principalmente em situações em que a decisão de um agente econômico influencia a decisão do outro - ou, em outras palavras, situações em que "eu penso que você pensa". Modelado o problema, é possível identificar a decisão que apresenta o melhor resultado econômico, conhecido como "equilíbrio de Nash": "a melhor decisão possível, levando-se em conta a decisão do outro.

Assim, a teoria dos jogos é uma verdadeira ciência da estratégia, onde pessoas envolvidas num mesmo contexto tomam decisões a partir de um conjunto de fomentos, ocorrendo uma interdependência recíproca entre todos os envolvidos.


Exemplo clássico da teoria dos jogos é o dilema do prisioneiro, resumidamente, o dilema é o seguinte: Dois suspeitos são presos pela polícia, essa não tem provas suficientes para que sejam acusados, então separa os prisioneiros e oferece a ambos o mesmo acordo:


1. Se um dos prisioneiros confessar (trair- colaborar) e o outro permanecer em silêncio, o que confessou sai livre enquanto o prisioneiro silencioso cumpre 10 anos;

2. Se ambos ficarem em silêncio (colaborar-colaborar), os dois serão condenados há 1 ano;

3. Se ambos confessarem (trair-trair), cada um será condenado há 5 anos de prisão.


Assim, o Dilema dos Prisioneiros é uma abstração de situações onde a escolha individual leva a resultados ruins, enquanto a colaboração traz melhores resultados.


Em outra linha, a seara jurídica familiar apresenta situações complexas e sempre permeada de muitos conflitos, ações como o divórcio, partilha de bens, guarda de filhos, inventário, muitas vezes as partes carregam sofrimento, luto, remorsos de túmulos, mágoas e com isso podem apresentar atitudes bem agressivas. Talvez seja a única área do direito que se impossibilita aplicar a lógica binária ganhador/perdedor.


Para Campbell os fatores determinantes dos impasses familiares que levam ao litígio são: a qualidade do relacionamento do casal na fase de pré-separação, fatores socioambientais que incentivam o litígio e a competição, histórias individuais de perdas mal elaboradas, relações de dependência patológicas e estresse.


Neste contexto, imagine X¹ e X², casados há 10 anos e pais de uma criança de 3, diante de uma escalada de conflitos decidem se divorciarem. A princípio, os pais concordam com a guarda do filho, afinal têm consciência que as responsabilidades são inerentes aos dois.


Porém, X¹ começa um novo relacionamento, X² não gostou, julga ser muito cedo, diante disso, começa a usar o filho como instrumento de sua mágoa. Não quer mais a guarda compartilhada, e começa a criar empecilhos de convivência entre X¹ e o filho. X¹, por sua vez, ao perceber as atitudes de X² resolve requerer a guarda unilateral, além de apresentar irresponsabilidade financeira frente ao filho, assim um toma a decisão apoiado na decisão do outro, gerando conflitos atrás de conflitos.


Outra situação muito comum: X¹ e X² são irmãos, diante do falecimento do pai, tornam-se herdeiros de alguns bens. X² era mais "próximo", inclusive cuidou dos pais, diante disso, acredita que tem autonomia para inventariar os bens na forma que deseja, X¹ ao tomar conhecimento, quer exatamente o bem que seu irmão adora, X² ao saber disso manda seu irmão colacionar o bem que recebeu em vida, o inventário que seria feito em algumas semanas no cartório, arrastará por anos no judiciário.


Assim, nos dois exemplos, ao invés de um acordo, a não-racionalização faz com que os interesses de ambos se distanciem, e principalmente, quando há filhos, não percebem os reflexos negativos na vida da criança envolvida.


Segundo Juan Vezzulla:

"O conflito consiste em querer assumir posições que entram em oposição aos desejos do outro, que envolve uma luta pelo poder e que sua expressão pode ser explícita ou oculta atrás de uma posição ou discurso encobridor."

Ações familiares "transbordam" no judiciário, há cinco anos tramitava no judiciário brasileiro 1.658.306 ações de família. Segundo o IBGE, o número de divórcios no País cresceu 75% em cinco anos e, no segundo semestre do ano passado, o total de divórcios saltou para 7,4 mil apenas em julho, um aumento de 260% em cima da média de meses anteriores.(muitos creditam esse aumento a pandemia).Tramitam mais de cem mil ações de cobranças de pensão alimentícia; o Brasil passou de 10.009 processos de partilha de bens em março para 14.366 em setembro de 2020.


Não obstante, cabe aqui destacar, Cardenas citado por Corinna Schabbel :

"Os fatos cotidianos das Varas de Família, das Varas da Infância e Juventude, dos escritórios de advocacia e dos consultórios de terapia familiar têm trazido evidências contundentes dos aspectos plurais da crise e do sofrimento causado pelas famílias enlutadas em virtude do divórcio. Cada família reage e faz a leitura do processo de divórcio de acordo com sua rede de significados e crenças, aspectos culturais e religiosos, que não podem ser desconsiderados pelos profissionais e instituições que as assistem, devendo sempre tratar a família como um sistema autônomo, de fronteiras delimitadas. A entrada desses “estranhos” na família deverá ser circunstancial e transitória, tendo como objetivo colaborar para a retomada de seu ciclo de desenvolvimento."

Para o ministro Luiz Fux há, o que ele chama de "vetores", que asseguram a eficiência de uma solução judicial. Um deles era exatamente a conciliação.

"A melhor forma da solução dos litígios, dentro da litigância civil, é a conciliação, onde não saem vencedores nem vencidos, e se otimiza o relacionamento social", declarou o Ministro.

Nesta linha, conforme a teoria dos jogos, quando as partes têm certeza da cooperação, a chance de desempenho do grupo aumenta consideravelmente, mesmo que a deserção traga o melhor resultado individual. Por isso, caso não tenha cooperação entre os envolvidos, a chance de todos saírem perdendo é grande.


A cooperação em situações que envolvem relações continuadas, sempre será a melhor estratégia. Sob esse enfoque, uma estratégia que precisa ser traçada é a análise do futuro, ou seja, é saber/reconhecer que o apresentado como solução é realmente aquilo que as partes conseguirão cumprir de forma continuada - Ex: Se uma parcela “x” cabe no orçamento e assim, conseguirá arcar com determinada despesa; se pegará o filho no horário combinado; se a convivência com os filhos ocorrerá da forma avençada.


Por fim, a Teoria dos Jogos pode auxiliar na resolução de conflitos, estudando as estratégias dos envolvidos, o motivo de suas tomadas de decisões, perceber suas dores, visando, assim, quais caminhos devem ser percorridos para garantir a colaboração recíproca. Incentivando o comportamento cooperativo, deve-se esquematizar pontos relevantes, sob uma perspectiva que ninguém perderá na negociação e sim resolverá um conflito e com isso todos alcançarão a paz.


REFERÊNCIAS


ABRANTES, Maria Luísa, A teoria dos jogos e os oligopólios. 1. ed. Multitema, 2004.


Aplicação da Teoria dos Jogos na Mediação de Conflitos: O Equilíbrio de Nash como Estratégia de Maximização de Ganhos, 2016, Revista de Formas Consensuais de Solução de Conflitos 2(1)

AZEVEDO, André Gomma de (Org.). Manual de mediação judicial. Brasília, DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 2013.


FRANCO, Carlos Vinicíus Lauande. A teoria dos jogos de Jonh Nash ao dilema dos prisioneiros e suas implicações em nossa sociedade. Web artigos.


GOLNÇALVES, Ana Valéria Silva, Conflitos após a morte: a mediação aplicada ao direito das sucessões. Belo Horizonte: Del Rey, 2019.


IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA.


Johnston, J. R. & Campbell, L. E. G., (1988). Impasses of divorce: The dynamics and resolution of family conflict. New York: Free Press.


MARINHO, Raul. Prática na Teoria: aplicações da teoria dos jogos e da evolução aos negócios. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.


ROBLES, Gregorio, As regras do direito e as regras dos jogos: ensaio sobre a teoria analítica do direito. São Paulo: Noeses, 2011. 310p


SCHABBEL, Corinna, Relações familiares na separação conjugal. Periódicos Eletrônicos em psicologia, vol. 7, nº 1, SP.2005.


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